Abriu a mala vermelha, guardou os sapatos, os chinelos. Do lado direito, religiosamente dobrado, pousou o pijama. O pijama às riscas que a mulher, já falecida, lhe tinha oferecido no último natal. Em cima, o casaquinho de lã, as calças de fazenda desbotada, a camisa, a gravata e o casaco que ainda tinha na lapela aquela flor. Arrancou o retrato da mesinha de cabeceira. Aquele retrato. O retrato da última vez que tinham sido felizes. Guardou-o noutro bolsinho da mala.
Queria sair dali, daquela terrinha que já nem era santa. Queria viajar, encontrar Aquele lugar perfeito. Longe da coscuvelhice das vizinhas, longe das guerras de palavras e trocas de galhardetes que só serviam para afastar as pessoas. Queria encontrar Aquele lugar perfeito, onde não o julgavam sem o conhecer, onde não havia insultos, interesses escondidos, onde não o fariam pagar pela opinião dos outros, onde não o puxavam para uma guerra de que não fazia parte, que nunca quis comprar. Onde o viam: simples, grisalho, de pele enrugada e barba mal desfeita.
Percorreu várias cidades e nenhuma era Aquele lugar. À noite, escondia-se numa qualquer pousada, não muito cara. Abria a mala tirava o retrato, o pijama às riscas, os chinelos, as meias quando fazia mais frio. Vestia-o, deitava-se e quando acordasse o pijama voltaria ao lado direito da mala. O retrato ao bolso mais pequenino.
Naquela noite, teve dificuldade em vestir o pijama às riscas, não tirou da mala os chinelos, nem as meias mas permaneceu agarrado ao retrato. Deitou-se, suspirou profundamente e ali estava. Aquele lugar perfeito. Não tinha a mala vermelha, o casaco de lã nem os chinelos. Mas tinha tudo o que precisava para ser feliz: o retrato e o pijama às riscas.
2 comentários:
Quando li o titulo do post chamou-me a atençao para o livro que me ofereceste nos anos :) "o rapaz do pijama as riscas".
Mas o que escreveste é ainda mais soberbo.. como sempre ;)
Todos andamos à procura de um lugar perfeito. Aquele.. especial e perfeito.
Bela partilha Elsaaa.
Saudades!
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