segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Recordar os sítios por onde passamos, onde fomos plenos e nos conhecemos por dentro deixa na boca um gosto agridoce, uma sensação de peito cheio de melancolia e uma vontade imensa de ter um botão de teletransporte que nos devolva aos lugares. Sabe a pouco recordar. Como sabem a pouco os dias em que nos deixamos perder em calçadas desconhecidas, entre jardins e nomes de ruas que nunca mais nos irão largar. Sabem a pouco os minutos que passamos a olhar o que nos rodeia na esperança de deixar gravados na retina os detalhes que máquina nenhuma guarda por nós. E sabe a pouco a recordação da terra quente que antes tivemos debaixo dos pés, da água gelada que nos irritou a garganta numa tarde de verão ao por-do-sol, do cheiro a alecrim. O sabor agridoce que deixa em nós é um vicio que nos consome os dias, que nos faz conta-los e dar-lhes sentido. É uma dependência, uma obsessão que nos alimenta ou se alimenta de nós e que mais do que nos nos puxar para os lugares que já são nossos, nos empurra para aqueles que ainda vão ser.

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Pedir

Já não peço desejos. No natal, no aniversário ou nas banais situações em que uma pestana nos cai na bochecha e alguém nos pressiona a pedir o que quer que seja. Já não peço. Pedir custa-me, dá-me suores frios e dores no estômago. Limito-me a fechar os olhos por uns segundos, esboçar um sorriso e não pensar em nada. Ficar, só. Aproveitar aquele pequeno instante que o tempo guardou para mim mesmo antes de abrir os olhos, mesmo antes de voltar a encarar o sorriso de quem tenho à minha frente e que mesmo que eu não o faça, pede desejos por mim.Esse tempo que toda a gente fala. De como nos sobra, do quanto nos falta. Esse tempo que é tudo, que cura tudo e que desaparece na fragilidade de um instante. Pedir é desperdiçar o tempo que não temos, perder o sabor adocicado das coisas que nos traz sem aviso. Já não peço!